O Museu do Meio Ambiente do
Jardim Botânico foi reinaugurado na segunda metade do ano passado e vale uma
visita. O espaço é agradabilíssimo: só ‘adentrar’ a antiga grande casa
restaurada faz bem à alma. Nele, a presente exposição –
Os Jardins Fazem a Cidade – encontra um lócus perfeito.
As amplas janelas abrindo-se
para o verde do Jardim e o azul mais distante das montanhas em torno da Lagoa
enquadram magnificamente as fotos apresentadas: assim, a dimensão arquitetônica
contribui para o prazer da degustação sensorial proposta.
O espaço é bem
refrigerado, alia a tecnologia de informações em LED à recepção gentil dos atendentes e least but
not last a detalhes úteis como um local onde
guardar os volumes e levar a chave... Em uma saleta confortável, é exibido continuamente o
documentário “Les jardins font la ville”,
do mesmo autor da fotografias. Há espaço também para crianças e atividades lúdicas.
Na exposição, os jardins, dos
mais variados estilos, estão retratados pelo fotógrafo francês Michel Corbou,
um artista que voltou seu olhar para investigar estes espaços públicos, ao
longo de uma década. Baseia-se
no seu livro “Des Jardins dans la ville”
(La Martinière, 2011) – que, infelizmente, não está à venda no local. Ao todo, 69 imagens estarão expostas. São
cenas de jardins e paisagens urbanas captadas na Europa (França, Espanha,
Portugal, Itália, Alemanha, Grécia e Suíça) e fotografias inéditas realizadas
no Brasil (Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo), onde Corbou esteve entre
novembro e dezembro de 2012.
Dentre os jardins cariocas, o Parque do Flamengo (acima) mereceu uma reflexão especial. Em geral, é
retratado do alto, onde o desenho geral apurado, a variedade de cores e
materiais e a sucessão de recursos para a interação com a paisagem natural pode ser apreciada. Mas para Corbou...
“(a pé pode-se perceber) o exato trabalho de proporções perfeitamente
calculadas, a harmonia das escalas e o seu uso, que permitem a circulação do pedestre passeando tão perto dos carros que a velocidade se mantém fora do foco”. Que percepção sutil e precisa da boa interlocução com a cidade!
Em painéis vizinhos às fotos – cuja leitura é imprescindível (o estilo é poético e até comovente,
dado a evidente paixão do escriba pelo assunto e sua amorosa antropomorfização
das plantas ) – são desenvolvidas as ideias que guiaram a concepção e a elaboração
do projeto. Revê-se, ali, a ancestral importância
cultural dos diversos tipos de jardins, como elementos que estabelecem relações sociais, culturais, educativas, políticas
e econômicas na cidade.
A Kolymbreta, vale dos templos,
Agrigento, Sicília, 500 a.C.
“As
laranjeiras persistem em entregar seus frutos mais de dois mil anos após as
primeiras colheitas”.
Jardim de Luxemburgo. Fonte
Médicis. Paris. 1630 e 1862.
Os jardins mais antigos vão
sofrendo restaurações sucessivas, pois “ (a)s
marcas evolutivas da história inscrevem-se nos jardins, paralelas incertas de
porvir aleatório.”
Coubou enfatiza a preciosidade
histórica dos jardins e suas múltiplas funções coletivas – mas também
individuais – ao longo do tempo, em prol
da saúde do corpo e da alma, da inspiração poética, do aumento do conhecimento
em botânica e geografia .
Pátio do Hôtel-Dieu, Paris,
Hospital criado em 651. “Na medicina
tradicional ( a cura) passa pela
calma, o silêncio, o tempo para olhar as nuvens e as flores, o tempo de escutar
o vento; o tempo de sentir e perceber.Tanto quanto pelas medicações necessárias e apropriadas.”
Acerca das estátuas do Jardim
das Tulherias, comenta: “Não há homens
nus neste jardim (...) . Este nu afirmado, lascivo, expõe-se com a ostentação
última da diferença entre os sexos.”
Lembra a quem percorre, distraído o Jardim do Palais-Royal, que por ali passaram membros ilustres da intelectualidade francesa que se encontravam nos cafés que o circundavam. Assim, “ Hoje, o transeunte encontra lá um silêncio bastante carregado de memória.”
Lembra a quem percorre, distraído o Jardim do Palais-Royal, que por ali passaram membros ilustres da intelectualidade francesa que se encontravam nos cafés que o circundavam. Assim, “ Hoje, o transeunte encontra lá um silêncio bastante carregado de memória.”
O antigo modelo de um jardim da botânica: Horto Botânico, Palermo, Sicília, 1786.
Leguminosas, chás, cítricos,
especiarias, muitas das iguarias comuns em nossas mesas e boticas “são migrantes da viagem das plantas.” Sem
fronteiras e em documento de identidade’ – alfineta o autor. “(Os jardins
botânicos) (a)ssinalam a necessidade da
aclimatação das espécies imigradas involuntariamente e de respeitar o tempo da
terra para permitir a transformação das espécies.”
Em termos hodiernos, Corbou incentiva a recuperação e revalorização do jardim
como espaço público e democrático como um desafio para as sociedades contemporâneas.
Jardins emergem quase naturalmente de terreno industriais abandonados... Cumpre cultivá-los e reintegrá-los à paisagem pública com especial carinho. |
Claramente imbuído de uma
intenção política libertária, defende a ideia de que o jardim tem ligação com o
desenvolvimento daquilo que poderíamos chamar de “espaço comum”, o qual
incorpora desde belos jardins até paisagens degradadas/abandonadas de nosso
cotidiano urbano.
E é claro que não pode faltar um
quê de mítico na mostra...
No início da exposição teve
lugar um seminário – pouquíssimo divulgado e cuja lotação já estava esgotada
quando foi postado na Internet – no qual
foi discutida a necessidade de discutir mecanismos para incorporar a paisagem
no planejamento territorial e urbanístico e nas políticas de caráter setorial,
com incidência direta ou indireta sobre o lugar. Dele nos ficam as informações
abaixo:
Do dia 08.03 ao dia 05.05.
Entrada livre e gratuita, de terça a domingo, das 9h às 17h.
http://museudomeioambiente.jbrj.gov.br/noticia/exposicao-os-jardins-fazem-a-cidade
Entrada livre e gratuita, de terça a domingo, das 9h às 17h.
http://museudomeioambiente.jbrj.gov.br/noticia/exposicao-os-jardins-fazem-a-cidade
Para ver mais fotografias: