domingo, 28 de abril de 2013

Os Jardins Fazem a Cidade


O Museu do Meio Ambiente do Jardim Botânico foi reinaugurado na segunda metade do ano passado e vale uma visita. O espaço é agradabilíssimo: só ‘adentrar’ a antiga grande casa restaurada faz bem à alma. Nele, a presente exposição – Os Jardins Fazem a Cidade – encontra um lócus perfeito.

As amplas janelas abrindo-se para o verde do Jardim e o azul mais distante das montanhas em torno da Lagoa enquadram magnificamente as fotos apresentadas: assim, a dimensão arquitetônica contribui para o prazer da degustação sensorial proposta.    
     

 O espaço é bem refrigerado, alia a tecnologia de informações em LED  à recepção gentil dos atendentes e least but not last a detalhes úteis como um local onde  guardar os volumes e levar a chave... Em uma saleta confortável, é exibido continuamente o documentário “Les jardins font la ville”, do mesmo autor da fotografias. Há espaço também para crianças e atividades lúdicas. 


Na exposição, os jardins, dos mais variados estilos, estão retratados pelo fotógrafo francês Michel Corbou, um artista que voltou seu olhar para investigar estes espaços públicos, ao longo de uma década. Baseia-se no seu livro “Des Jardins dans la ville” (La Martinière, 2011) – que, infelizmente, não está à venda no local.  Ao todo, 69 imagens estarão expostas. São cenas de jardins e paisagens urbanas captadas na Europa (França, Espanha, Portugal, Itália, Alemanha, Grécia e Suíça) e fotografias inéditas realizadas no Brasil (Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo), onde Corbou esteve entre novembro e dezembro de 2012.

Dentre os jardins cariocas, o Parque do Flamengo (acima) mereceu uma reflexão especial. Em geral, é retratado do alto, onde o desenho geral apurado, a variedade de cores e materiais e a sucessão de recursos para a interação com a paisagem natural  pode ser apreciada. Mas para Corbou... 
 “(a pé pode-se perceber) o exato trabalho de proporções perfeitamente calculadas, a harmonia das escalas e o seu uso, que permitem a circulação do pedestre passeando tão perto dos carros que a velocidade se mantém fora do foco”. Que percepção sutil e precisa da boa interlocução com a cidade! 
  
 Em painéis vizinhos às fotos – cuja leitura é imprescindível (o estilo é poético e até comovente, dado a evidente paixão do escriba pelo assunto e sua amorosa antropomorfização das plantas ) –  são desenvolvidas as ideias que guiaram a concepção e a elaboração do projeto. Revê-se, ali, a ancestral importância cultural dos diversos tipos de jardins, como elementos que estabelecem  relações sociais, culturais, educativas, políticas e econômicas na cidade.



A Kolymbreta, vale dos templos, Agrigento, Sicília, 500 a.C. 

“As laranjeiras persistem em entregar seus frutos mais de dois mil anos após as primeiras colheitas”.









Jardim de Luxemburgo. Fonte Médicis. Paris. 1630 e 1862.

Os jardins mais antigos vão sofrendo restaurações sucessivas, pois “ (a)s marcas evolutivas da história inscrevem-se nos jardins, paralelas incertas de porvir aleatório.”



Coubou enfatiza a preciosidade histórica dos jardins e suas múltiplas funções coletivas – mas também individuais –  ao longo do tempo, em prol da saúde do corpo e da alma, da inspiração poética, do aumento do conhecimento em botânica e geografia .


Pátio do Hôtel-Dieu, Paris, Hospital criado em 651. “Na medicina tradicional ( a cura) passa pela calma, o silêncio, o tempo para olhar as nuvens e as flores, o tempo de escutar o vento; o tempo de sentir e perceber.Tanto quanto pelas medicações necessárias e apropriadas.”



Acerca das estátuas do Jardim das Tulherias, comenta: “Não há homens nus neste jardim (...) . Este nu afirmado, lascivo, expõe-se com a ostentação última da diferença entre os sexos.”





Lembra a quem percorre, distraído o Jardim do Palais-Royal, que por ali passaram membros ilustres da intelectualidade francesa que se encontravam nos cafés que o circundavam.  Assim, “ Hoje, o transeunte encontra lá um silêncio bastante carregado de memória.”





O antigo modelo de um jardim da botânica:  Horto Botânico, Palermo, Sicília, 1786.

Leguminosas, chás, cítricos, especiarias, muitas das iguarias comuns em nossas mesas e boticas “são migrantes da viagem das plantas.” Sem fronteiras e em documento de identidade’ – alfineta o autor. “(Os jardins botânicos) (a)ssinalam a necessidade da aclimatação das espécies imigradas involuntariamente e de respeitar o tempo da terra para permitir a transformação das espécies.”

Em termos hodiernos, Corbou incentiva a recuperação e revalorização do jardim como espaço público e democrático como um desafio para  as sociedades contemporâneas.

Jardins emergem quase naturalmente de terreno industriais abandonados...
Cumpre cultivá-los e reintegrá-los à paisagem pública com especial carinho.
Claramente imbuído de uma intenção política libertária, defende a ideia de que o jardim tem ligação com o desenvolvimento daquilo que poderíamos chamar de “espaço comum”, o qual incorpora desde belos jardins até paisagens degradadas/abandonadas de nosso cotidiano urbano.
  
E é claro que não pode faltar um quê de mítico na mostra...



No início da exposição teve lugar um seminário – pouquíssimo divulgado e cuja lotação já estava esgotada quando foi postado na Internet –  no qual foi discutida a necessidade de discutir mecanismos para incorporar a paisagem no planejamento territorial e urbanístico e nas políticas de caráter setorial, com incidência direta ou indireta sobre o lugar. Dele nos ficam as informações abaixo:


 Museu do Meio Ambiente do Jardim Botânico. Rua Jardim Botânico, 1008 Jardim Botânico. CEP: 22460-000. Telefones: Recepção: 2294 6619; Educativo: 3874 1229. Contato: museumeioambiente@jbrj.gov.br.
Do dia 08.03 ao dia 05.05.
Entrada livre e gratuita, de terça a domingo, das 9h às 17h.
http://museudomeioambiente.jbrj.gov.br/noticia/exposicao-os-jardins-fazem-a-cidade
Para ver mais fotografias:

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