A tradução do
filme em cartaz no Rio de Janeiro de “Wild” para “Livre” bem expressa a
preferência do tradutor-intérprete, afinado com uma dada tendência dos cariocas da montanha, de enfatizar na jornada da protagonista a
busca de liberdade em relação a um seu atributo ‘Selvagem” a que a tradução
literal do termo ‘wild’ do inglês melhor
corresponderia.
Mas tal preferência pela “liberdade” também
justifica a leitura que nos parece melhor convir à película: trata-se de uma
‘viagem íntima’ empreendida pela protagonista à procura do reencontro consigo
mesma, obrigando-se a um sobre-esforço constante e indo além de qualquer
elaboração lógica em prol de atender a uma inspiração da afetividade. É também neste sentido que consideramos bem
ajustados tanto os flashbacks ao longo da
caminhada – que revisitam, transformando-os no novo contexto, os
eventos traumáticos que teriam levado a personagem à sua débâcle - quanto uma
interpretação de Reese mais suave (não se justificando, pois, as críticas
de que teria sido pouco ‘selvagem’ nas
cenas mais fortes)
‘Wild’, filme protagonizado por Reese Witherspoon, é baseado em fatos reais, sendo uma adaptação do best-seller "Livre – A jornada de uma
mulher em busca do recomeço" (Objetiva), de
Cheryl Strayed. Foi, aliás, a própria Reese, que, aos 38 anos e também
produtora de ‘Wild’, contatou Cheryl diretamente para comprar os direitos do
filme depois de ler o livro antes da publicação. Em termos da carreira de Reese
Witherspoon, o momento em que a protagonista arranca uma grande unha do dedo do
pé ensanguentado na cena de abertura de seu novo filme torna claro que a atriz
vencedora do Oscar tomou nova direção em relação à maioria dos seus filmes,
onde em geral dá vida a mulheres bonitas e alegres. De acordo com este
desígnio, e em termos da busca de veracidade do longa, o diretor Jean-Marc
Vallee, exigiu que os espelhos no trailer de maquiagem fossem cobertos, para
evitar que Reese não soubesse como estaria sua aparência sem a maquiagem. "Foi duro, eu nunca me vi em
um filme como esse antes", disse Reese antes da exibição Festival
Internacional de Cinema de Toronto, recentemente.

Quando inicia sua ‘via crucis’, Cheryl está lamentavelmente despreparada para
ela.
Fica sem comida e água, perde as
botas e tem o corpo coberto de feridas. Mas entre sua bravura e a bondade de
estranhos, ela aguenta 94 dias, enfrentando
variações climáticas que vão do deserto às neves, até chegar à Ponte dos Deuses que é o fim de sua jornada.
Ali, pronuncia as belas palavras de autoaceitação e transformação que são o
prenúncio para uma vida mais feliz e produtiva.
“Livre” descreveria um ritual de passagem a ser
realizado através da reconexão do indivíduo urbano com ‘o grande Ar Livre” , essencial
(para quem escolhe esta via) para uma mudança mental e existencial profunda, qual a relatada na película. O
gênero ‘on the road’ remete para a natureza selvagem concreta, por nós perdida
há tão pouco tempo, algo que a nossa
mente parece ainda não ter conseguido processar em apenas três ou quatro
gerações. Podemos também associar esta natureza, em termos psicológicos, com a
nossa própria instintividade, que precisaria deste confronto direto com algo
mais visceral e potente que ela própria , para imprimir uma nova tonalidade,
mais amena consigo própria, à nossa admissão, compreensão e novas expressões das
‘formas elementares’ da nossa libido.
Portanto, ‘ponhamos o pé na estrada’ para
assistirmos ao filme. Tendo estreado há apenas um mês, ele está em cartaz
em uma única sessão, a das 14;10 hs., no Cine Laura Alvim. Como, para fazer
honra ao espírito da película, eu fui caminhando do Jardim Botânico à Praia de
Ipanema (pela Lagoa, em um trajeto que durou exatamente uma hora), aviso que a
projeção começa exatamente no horário e não há trailers antes. Como a plateia
estava cheia, quase perco o início e o lugar. Tomara que esta procura dos
espectadores mais sensíveis prolongue a estadia do filme em nosso circuito, mas
não é garantido.
Deu vontade de ver o filme!
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