Cada um de nós vivenciou seus aspectos favoritos da amplíssima gama de esportes disponíveis nas recentes Olimpíadas. Em especial quando a nossa modalidade preferida é pouco popular no nosso país. É o caso da modalidade Dressage - ou Adestramento - que em raras ocasiões podemos apreciar no esplendor de sua mais perfeita performance.
Em um picadeiro de 20ms. por 60ms, esta sofisticada, graciosa e generosa modalidade hípica enaltece a relação mais harmoniosa e natural possível entre o homem e o cavalo. O objetivo é mesmo que o cavalo reproduza, sob as 'ajudas' - movimentos do corpo, mãos e pés do cavaleiro - os movimentos que executaria em liberdade. A integração profunda entre ser humano e animal atinge aqui o seu ápice, exemplificando o melhor do espírito olímpico.
O código de vestimentas é deliberadamente elegantíssimo, com cartola (opcional), fraque, plastron. As 'reprises' - nome dado às apresentações - são feitas diante de um júri de três ou cinco juízes que ficam em casinhas nas extremidades do picadeiro.
As reprises começam e terminam com um cumprimento do cavaleiro na reta em frente a estas casinhas. O traje militar também é permitido, assim como o capacete usual.
Mas o garbo da postura e da saudação, independentes da vestimenta, já são levados em consideração nas notas desde este momento inicial.
É difícil mesmo para o leigo interessado bem discernir as múltiplas figuras e os movimentos mais sutis de trote, galope e passo, em suas várias subdivisões. Vamos tentar fazê-lo , em parte, adiante, mas na foto abaixo oferecemos já um flash destas diversas andaduras.
Antes de nos arriscarmos a identificar algumas figuras, detenhamo-nos um pouco nas assim chamadas 'ajudas'.
Observe-se a correta postura do corpo do cavaleiro acima e a cabeça do cavalo docilmente 'colocada' num arredondado típico de seu bom contato com a mão do cavaleiro. Os sutis estímulos para a mudança das andaduras são sinalizadas por pressão e oscilações do cócix, dos ísquios, das pernas do cavaleiro contra o amplo dorso do cavalo. Sempre com grande delicadeza. quanto menos o cavaleiro balança na sela, agita pernas e braços, mais perfeita é considerado o desempenho do conjunto.
A posição do pé deve ser com a ponta do pé
na ponta do estribo e o calcanhar em encostando no corpo do cavalo. Se houver uso de espora deve ser muito suave. As esporas usadas também têm ponta arredondada para não machucar o animal. Qualquer vestígio de sangue, no exame feito após a exibição, será motivo - justíssimo ! - para a desclassificação do cavaleiro.
As mãos manuseiam com cuidado dois tipos de rédeas: o freio - que não deve ser utilizado
com muita frequência e força - e o bridão. As luvas devem ser novas. Cada mínimo movimento dos dedos que harpejam, como se foram cordas de um instrumento musical, faz diferença, a partir da embocadura do cavalo na orientação deste nas filigranas das diferentes figuras.
Antes de começar a reprise, o cavaleiro distende e prepara o animal à volta do picadeiro. Já dentro deste, depois, irá conduzi-lo o mais perto possível da cerquinha baixa, para demonstrar expertise na boa observação dos limites. Observe-se, na tela grande ao fundo, quão pequena é a plateia, pois o esporte ainda não é o suficiente divulgado no país.
Arriscamo-nos, agora, a identificar algumas andaduras, talvez enganado-nos, aqui e ali, para dar ao nosso leitor ideia da complexidade fina e variedade das figuras a serem executadas.
No trote e no galope apoiados, o cavalo se apoia mais pesadamente á direita ou à esquerda, inclusive graciosamente cruzando as perninhas para poder fazer este movimento.
O passo aparentemente é uma figura 'fácil': ledo engano. O animal deve relaxar, estender-se e - como se trata aqui da submodalidade do passo alongado - a cada passada a pata traseira deve pisar além de onde ficou a marca da parta dianteira em cada lado da corpo do animal (direito ou esquerdo). Vale inclusive dois pontos.
Outra figura extremamente graciosa de ser ver é o 'piafê' onde o cavalo levanta em um dado compasso de tempo as patinhas, uma de cada vez, dando a impressão de um catita saltitado .
A 'passage' é semelhante ao piafê , mas já abrido o passo um pouco, para a seguir tomar o galope. Embora reconhecendo cada figura, nos instantes em que os locutores explicam a mudança dos movimentos, identificá-los nas fotos é mais difícil para o leigo. Observe-se a letra do alfabeto (H) no mourão na cerquinha atrás do cavalo. Estes são os pontos exatos em que os cavaleiros, em suas evoluções ora acompanhando a cerca, ora cruzando de diversas maneiras o picadeiro, devem mudar a andadura do cavalo. Atrasar-se ou antecipar-se neste movimento, em relação ao mourão em que ele deve se dar, custa pontos.
Outra eletrizante e difícil figura é a pirueta. Apoiando-se nas patas posteriores, o animal deve dar a volta a si mesmo, como num rodopio, como um bem regrado e bem conduzido turbilhão.
Flashes de momentos da pirueta, quer da executada a partir da direita, quer da esquerda. As duas são obrigatórias nas reprises e a contagem de cada uma é de dois pontos, pela sua dificuldade. |
Outro passo difícil de identificar 'a posteriori' são as avariações de galope, o galope de dois e o de um. Vale lembrar que cada reprise é julgada por sua perfeição técnica mas também por seu estilo artístico, expressividade, elegância e leveza da apresentação, ou seja de acordo com critérios muito mais sutis e subjetivos.
Depois da reprise a regra é um afetuoso abração do cavaleiro no seu ginete, reafirmando a ancestral aliança.
Notem a touquinha nas orelhas do cavalo para que lhe sejam atenuados os sons que possam distraí-lo |
Repetindo o Ouro das Olimpíadas de Londres, a Inglaterra levou a medalha através da lindíssima reprise de Charlotte Dujardin e Valegro que incorporaram a lenda do centauro, tão profundamente eram afinados como conjunto e tão espontaneamente harmoniosa foi a sua performance !
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