domingo, 27 de janeiro de 2013

Alerta aos espíritos refinados: Blocos de Carnaval à vista!


O Carnaval do Rio, qual inquebrantavelmente bem-humorado Polvo Psicodélico, se arrasta em nossa direção, emerso das poças da última chuvarada... Gáudio para os cariocas da praia e para os turistas! Desalento para os cariocas da montanha e os viajantes!

Este polvinho remete ao pavão misterioso do Ney. Por que será?
(ver http://www.youtube.com/watch?v=FWmI5VqTNwU)
Caluda! Os blocos de rua, eufóricos em seu perambular malandro, envesgam o livre fluir do trânsito pela cidade e acrescentam odores ácidos de cachaça e suor (dentre outros...) ao usual bafejo tórrido do ar parado. Evitemo-los, espíritos de escol!

As montanhas, praias, alamedas de árvores submersas na multidão ululante


A origem, em seus longínquos primórdios, do Carnaval, teria cunho liberador das pulsões afetivas contidas.  O Carne Vale, a festa da carne, se origina em antigas celebrações gregas e romanas, onde, nos rituais de Dionísio, as bacantes realizavam cerimônias secretas nas florestas. Bebiam para alterar a sua percepção da realidade – cumprindo a função sagrada do vinho, na Antiguidade – até o transe e o êxtase. Tendo feito, alucinatória e impunemente, amor com o próprio Dionísio, exultavam de triunfante ‘entusiasmo’ (= “portar o deus dentro”). 



Assim, as mulheres, categoria, em geral, depreciada na Grécia antiga, realizavam uma ‘catarse’ liberadora, de alcance, quiçá, indispensável ao psiquismo humano, então.
Mas, hoje, talvez o conceito mesmo de catarse deva ser revisto, na própria psicanálise que tão bem o incorporou a seus princípios, no século passado,. No atual contexto cultural, que ‘liberação’ ela proporciona ?  

(para ilustrar musicalmente o papel convencional da mulher grega, ver http://letras.mus.br/chico-buarque/45150/


Quando chega ao Brasil trazido pelos portugueses, por volta de 1750, a festividade era conhecida como “Entrudo”, palavra que vem do latim e significa “entrada”, uma alusão ao início da quaresma no calendário religioso. O Cristianismo havia adaptado a insurreição ancestral às conveniências da Páscoa - a Terça-Feira Gorda é definida, no calendário cristão, 47 dias antes do domingo de Páscoa. O Carnaval passa a significar  tempo de diversão e exagero, grandes comes e bebes, antecedendo o ingresso em um período de reflexão e jejum. Então, os fiéis se recolheriam para reavaliar sua vida cristã, tendo por ápice do processo, em termos, inclusive, de outro tipo de catarse, a Semana Santa.


'Pensa no pecado e no arrependimento, ó caboclo cabra da peste!'
(Para uma descrição saborosa da adaptação das festas cristãs às crenças indígenas na roça do Brasil ver: http://www.yubliss.com/blog/5991?page=3)
A continuação da trajetória do Carnaval, sob inspiração patropi, teria cunho liberador dos oprimidos, agora em termos sociológicos. Logo, o entrudo se transformou em uma ocasião para guerras de água, farinha e limões de cheiro pelas ruas, realizadas por escravos e os sempre presentes malandros de plantão. As classes mais abastadas logo se dispuseram a participar, entornando, de suas sacadas, vasos com excrementos sobre os foliões. 

Culturalmente falando, quais seriam as ‘urbanas classes oprimidas’ atualmente?

Estreitando nosso foco, poder-se-ia falar de uma liberação do ‘provincianismo’ na Maravilhosa (cidade do Rio de Janeiro, of course) quando a então Capital Federal resolve imitar as metrópoles estrangeiras, na virada entre os séculos XIX e XX, em seu  festejo do Carnaval.




Sob inspiração europeia, os primeiros blocos carnavalescos, cordões e os famosos cortejos de automóveis (corsos) surgiram no começo do século XX. As pessoas decoravam seus carros, fantasiavam-se e, em grupos, desfilavam pelas ruas das cidades, dando origem aos carros alegóricos.

Gestavam-se, então, discretamente, nos bastidores do grande palco público, as tragédias de busca de ascensão social através do crédito indiscriminado (os agiotas ainda não se haviam instalado em agências bancárias). 

Festividades que exigiam gastos de representação comprobatórios da Alegria-Alegria, já inspiravam pequenas obras primas como o conto de Ribeiro Couto (1898-1963) O Bloco das Mimosas Borboletas.

 ( vale a pena ler em http://www.releituras.com/ribeirocouto_bloco.asp ) (Remark: gloogle the author & story names to translate it).


Havia certa poesia e uma gentil ingenuidade, então, nos blocos, que surgiam como opção da pobreza valorizada culturalmente como sinônimo de espontaneidade e singeleza.


Qual o destino da exuberante catarse carnavalesca – a Carne da Alma exposta e destemida – no século XXI?
Dionísio fashion: hermafrodita e sofisticado

Sob tais contornos, só a duas categorias humanas se admitiria “gostar do Carnaval”. Por um lado, os muito inocentes que se propõem a acreditar na alegria com data marcada – incluindo-se, aí, os muito jovens, em fase de experimentação dos mecanismos catárticos de sua cultura. Por outro, os muito tristes que se contentam (ao menos provisoriamente) com qualquer sobra de riso e confete; ou, pior, que nem sabem a extensão verdadeira da tristeza que habita, no dia-a-dia, as suas almas... 

Quem fez isto com o gatinho? Inocência traída...
 Portanto, os Blocos do Rio são por nós considerados, tendo em vista o empobrecimento de seu legado cultural e inevitável desconforto nos trajetos antes-durante-depois:   ‘Oip’! =  Officially Indigenous Programme'

Para os cariocas da montanha e viajantes saberem que trajeto evitar, nas próximas semanas:

P.S. Todavia-porém-contudo, aproveitem as dicas, prezados cariocas da praia e confrades turistas !

Agradecemos o ‘empréstimo’ do nosso Po(l)vinho a

Um comentário: