terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

As flores e os translados

 Difícil falar de todas as minúcias de desfazer a casinha tão bonita e bem entrosada de minha mãe e levar embora  seus móveis, quadros, pratas e louças, plantas queridas e pequenas preciosidades de suas memórias...


Cada grupo destas ''flores da alma', que enfeitam a existência, vai pra minha casa, para o sítio, para a casa da fiel empregada da mamãe ... para dar-lhes espaço no meu lar na cidade , separo coisas nele há muito guardadas para viajarem para meu lar do campo... e modifico propostas de como ocupar estes dois espaços - que cada vez mais dividem sua importância em minha vida - em função da futura breve ocupação pelos móveis e acessórios de minha mãe. Legados de uma dada época, de uma bela filosofia de vida e de nossas entrelaçadas e também às vezes entre si alienadas histórias de vida. 

Não quero aqui exibir as pilhas de caixas - de todos os materiais - de sacos, de  resíduos, que enchem os cômodos e cada dolorido fragmento de tempo de que disponho para revirar estas gavetas repletas de novelos de poeiras e de  névoas douradas . 

Então, apelo para a poesia da Natureza e, enquanto perambulo, nos meus momentos mais raros ainda de descanso, pelo meu amado Jardim Botânico, vejo os diferentes efeitos das quaresmeiras em flor nesta época do ano,  conforme caminho  pelas onduladas veredas do parque e estas árvores feitas de estranhas rosas suspensas transladam-se em múltiplas formas e perfumes, de acordo que a perspectiva de que as vislumbro. 


São estas as imagens que quero ter na lembrança desta fase de redefinição de quem eu sou, após a despedida , em minha própria história, do contato físico com este elemento simbólico e carnal crucial de meu reconhecimento de mim mesma, que foi, que é a minha mãe de sangue .


Indo além dos objetos concretos e perecíveis em si, projetando as fímbrias de tais percepções nas luminosidades e nas sombras de  árvores em flor no Parque que minha mãe me ensinou a frequentar, admirar  respeitar, honrar e, acima de tudo, a amar.  






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