terça-feira, 28 de abril de 2020

Susto e Beleza no Hospital do Carmo

O Corona continuou me assombrando na semana que passou ... desta vez, de forma mais direta, próxima e pesada. Minha mãe foi hospitalizada de urgência, com sintomas respiratórios . Nos primeiros dias, foi um susto grande! Depois do resultado negativo do exame para o corona e constatação de estar ela com pneumonia, embora a preocupação tenha se mantido. o quase-pânico diminuiu. Agora  ela já voltou par casa, thanks God !

Durante este processo, enquanto aguardava, aturdida. as noticias, o que me fez particular bem foi vaguear pelos belos ambientes do egrégio Hospital onde ela ficou. Então, animava-me a apreciação dos símbolos de cuidado impregnados nos seus espaços internos e externos, conforme planejados, na época de sua construção, em prol de um abrangente entendimento da função curativa.



Sua ocupação está restrita a pacientes suspeitos ou sofrendo de corona, e como os laboratórios que ocupam três dos cinco andares estão fechados, os amplos halls, escadas , páteos, corredores, devidamente restaurados,  estavam vazios e silenciosos.




 Era como se percorréssemos um cenário de cinema...
 

O que mais me agradou foram os jardins internos, com as plantas bem tratadas , o que mostra o resguardo - a instituição foi adquirida por uma nova rede e toda reformada - para com um dos aspectos tradicionais dos antigos estabelecimentos de internação : a crença de que o ar bem oxigenado que vem dos reinos vegetais  e sua dimensão estética reparadora são benéficos à saúde física e mental.

Subindo o primeiro lance de escadas que vemos acima,
o primeiro jardinzinho oferece mesinha e cadeiras para descanso 


Em torno da sua fonte (desativada ainda) outros banquinhos e , em quatro pontos, estatuetas clássicas  diversas , representando estações do ano e divindades míticas.



Pelo outro trecho em degraus , que se vê ao fundo , temos acesso a novos jardins circulares






Que vão-se imiscuindo por entre os edifícios, novos e velhos, entremeados por escadas em que os azulejos originais foram preservados ou restaurados.

É claro que todos os elogios são merecidos  à excelente equipe - médicos, enfermeiras, atendentes, fisioterapeutas,  nutricionistas e psicólogas -  que com tanta competência  e carinho ajudaram minha mãe a se restabelecer prontamente.

Mas uma  boa administração não é aquela que , justamente, sabe agregar e inspirar bons profissionais com a mesma sensibilidade com que preserva o patrimônio  simbólico e todas as expressões da vida a seu redor ?


Nossos agradecimentos sinceros ao antigo Hospital do Carmo, 
ao qual fomos apresentados através do setor CLIMES e daquele de seus quartos particulares.   



quarta-feira, 15 de abril de 2020

Os caminhos do meio

Uma das poucas fontes de um pouco de distensão e abertura para o Mundo de que dispomos, nestes tempos de atroz aprisionamento físico (e suas reverberações no mental), são nossas caminhadas, nos  espaços que ainda se mantêm abertos. A Lagoa, pedaço do Rio que não dá para cercar com grades,  tem sido um dos nossos últimos recursos, uma vez que Jardim Botânico, Parque Lajes e até a Floresta da Tijuca foram fechados.

Durante as primeiras semanas da quarentena, a Lagoa , deserta, pertencia toda a caminhantes e raros ciclistas, soltos e leves na amplidão circundante  ...

Mas, com um relaxamento gradual do isolamento absoluto, mais e mais pessoas enchem as pistas de concreto ...e logo voltam aos velhos hábitos de se exercitar muito perto umas das outras ... e quase em nós esbarram, indiferentes, deseducadas e insensatas.


E , então, restam-nos os caminhos do meio, por sobre a grama , para , à guisa de pequenina transgressão -  entretanto também expressão de prudente  obediência -   mantermos a distância regulamentar dos invasores dos espaços  e a  ilusão de um livre trotar pela Terra.

Gosto muito do "caminho do meio" , desde meus primeiros contatos com o Budismo, até os mais recentes com a teoria da auto-organização dos seres vivos pelo ruído; esta diz que  a transformação criativa, nos indivíduos e na cultura, ocorre em um ponto preciso entre o redundante, estático, estabelecido e a novidade, o dinâmico , o inesperado . Entre os dois, o risco. Pois o oposto da transformação, nesta esfera radical ( e no entanto, presente em cada  pulsar de nossa existência !) , é a destruição do sistema. Se não preferirmos o estereotipado ou a loucura , nosso cotidiano é - saibamos disto ou não, mais ou menos apegados a um dos dois pontos extremos -  um traçado constante e mutante, por entre os hábitos e a surpresa.

Nos momentos das pequenas tomadas de decisões desta pandemia, caberia buscar um equilíbrio disruptivo entre as normas generalizadas do auto-cuidado com os corpos (próprio e coletivo)   e as  iniciativas originais pessoais, que alimentam o senso de  autonomia da mente.   Na medida do possível, uma não contradizendo a outra, mas as reforçando mutuamente através de um contraste estimulante, que leva em conta os tropeços indispensáveis a esta ambígua estratégia.

É claro que isto deve ser feito de forma absolutamente  individualizada, abarcando diferentes aspectos desta contradição de propósitos. Para um, pode representar  assumir  riscos inéditos no próprio trabalho, outrora corriqueiro, feito no ambiente menos repressivo de casa. Ou , afinal, tomar coragem para um posicionamento  no âmbito doméstico há muito adiada. E sempre lembrando de se estar atento á diferença entre o 'intuito' mais profundo e sutil de cada uma destas atitudes: saber bem balancear o reconhecimento do quanto elas servem a uma 'acomodação adaptativa' ou a uma 'mudança visceral';  se a primeira persiste em 'ir aguentando' para voltar à 'normalidade' , a segunda investe em não desejar um retorno, mas um salto qualitativo em uma direção diferente. Talvez o critério decisivo a ser levado em conta seja o risco a ser corrido, mas este é um tema muito denso a ser desenvolvido aqui !

Tenhamos presente, contudo, a nossa responsabilidade  de cultivar o impulso revolucionário no mais íntimo de nossas almas, envolvendo-nos, pois, com  a real Política, construção coletiva de formas de propiciar o conviver dos seres, cada um deles único,  no Mundo. Aproveitemos esta oportunidade de reflexão e prática transformadoras para ir além da homogeneização reinante, desta forma reforçando, pois, a verdadeira solidariedade.

Portanto, muito  cuidado com as receitas - obrigatoriamente uniformizadas -  do 'como enfrentar o virus' , mesmo as bem mais intencionadas e eruditas!  Compartilhemos intuições e hipóteses, e , principalmente, detenhamo-nos na formulação mais precisa de alguns projetos suspeitos de utópicos, imprimindo-lhe consistência, para fazer face, de forma efetiva, à situação .  Com os necessários intervalos da fruição estética, para realimentar a energia da alma na consecução deste esforço.

Para mim, a Natureza é parte constituinte de meu ser; é em seu seio que preciso exercitar o paradoxo.
Assim, saudosa de meu sítio, redescubro como a grama dos canteiros entre as pistas da Lagoa é  fresca, cacareja e ronrona  feliz sob meu tênis gasto ...  enquanto aprecio mais de perto as árvores  antigas  das margens das calçadas e os  arbustos adolescentes das frutíferas que nós mesmos plantamos alguns meses atrás.

Nem fotos tirei deste  perambular pelo verde, para que não fique sequer registro na Grande Rede desta Substantiva secreta estratégia de Sobre-Vivência...




domingo, 12 de abril de 2020

Sexta-feira da Paixão (atrasada!) na quarentena

O pior da quarentena é quando acontecem os problemas que já seriam complicadinhos de resolver em tempos triviais e que ficam complicadíssimos em contexto de lojas fechadas e serviços essenciais indisponíveis.

Nesta última semana, eles se sucederam em uma cascatinha crescentes daquelas angústias do cotidiano que restringem as possibilidades de aproveitar de algum jeito a diminuição do ritmo usual de obrigações.

O ar condicionado de meu  carrinho, que já vinha funcionado mal, pifou de vez. Menos mal na época menos quente do ano. Mas, desconfortável...
Eu amo meu carro velhinho, mas em horas como esta , fico com muita inveja dos automóveis novos... 
 ...aos quais nunca faltam recursos de conforto ! 


Outro ser doméstico que vinha também falhando e falhando na performance foi meu celular . Agora, ameaça-me seriamente de deixar-me no silêncio das escutas, inclusive as terapêuticas, indispensáveis na minha clínica em tempos de isolamento social . Comprei um carregador por Internet, mas , 10 dias depois, nem sombra dele, Os celulares mais novos tem um chip diferente do meu e minha prestadora que poderia trocar o aparelho + chip está fechada !



A gota d'água foi quando , em plena sexta-feira santa, feriado absoluto , minha geladeira pifou ! Cheia de coisas como sempre , com menos de três anos de uso !!!!

Foi aquele desespero de sair procurando profissional e comprando sacos grandes de gelo para distribuir pelos isopores, em um salve-se ( a comida que se)  puder geral !!!

Feliz Páscoa - na medida do possível - para todos !







segunda-feira, 6 de abril de 2020

Quarentena : as silenciosas ruas vazias

A quarentena - decretada a partir do Corona vírus, neste terceiro mês de 2020 , na nossa bela cidade -   nos trouxe um impacto quase imobilizante...

Durante as duas primeiras semanas ficamos meio atordoados, sem saber o que pensar, o que temer, do que desconfiar ... Como sempre, neste blog, valorizamos o aspecto desafiador, instigante, criativo de TUDO o que acontece . mas precisamos de um tempo para ir além da perplexidade difusa que nos confundia percepções mais aguçadas e sutis... 

Optamos pelo 'isolamento não-restritivo' - ou seja, para aquele recomendado para pessoas que não se inserem nas categorias de grupo de risco. Agimos estritamente dentro das recomendações da OMS, em termos de higienização e manutenção de distância minima entre pessoas.

Mas mantemos - sempre de acordo com o que as leis de nosso pais permitem - alguns procedimentos para nós indispensáveis a nossa saúde física e mental, como as caminhadas  ao ar livre . 

No curso desta e outras atitudes de teor similar, uma coisa logo nos maravilhou : o vazio maravilhoso  das ruas sem trânsito. Parecíamos ter voltado há trinta anos atrás !


Prédios mais clássicos e vielas de comércio menos bem conservada , todos embalados no sonho doce de uma valsa antiga , passos de cavalheiros e damas pouco apressados, imersos em um viver macio...


Melhor ainda foi ver a nossa rua Jardim Botânico entregue à cisma solarenga das  grandes árvores e os murmúrios sonoros - audíveis das calçadas (já que o parque, infelizmente, foi fechado!)  - dos passarinhos sedentos do silêncio inédito há décadas, como o único fundo musical digno de seus acordes !


Que, dentre os benefícios  a serem advindos desta fase sofrida, um pouco mais de silêncio e quietude e paz seja devolvido as nossas vias urbanas !!!